Motta não fala sobre perda de mandato de Ramagem — mas veta que deputado possa votar dos EUA
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), optou por um discurso cauteloso no que diz respeito a uma possível cassação ou perda de mandato do Alexandre Ramagem (PL-RJ), mesmo após a condenação definitiva do deputado e suas aparições nos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, porém, Motta tomou uma medida prática: proibiu que Ramagem — ou outros deputados em situação similar — exerçam seu voto ou participem de deliberações enquanto estiverem fora do país.
Esse mix de omissão sobre a pena política e de rigidez sobre a participação parlamentar marca o que pode ser visto como uma estratégia para manter o controle no Legislativo sem romper com a vigência nominal do mandato.
O que diz Motta — e o que ele evita comentar
- Sobre a possibilidade de Ramagem perder o mandato, Motta evita fazer qualquer declaração contundente. Ele tem mantido silêncio sobre punições internas, mesmo com pedido público de cassação da bancada do PT, que argumenta que a condenação com trânsito em julgado exige a imediata perda do cargo.
- Em vez disso, Motta concentra seus esforços legais em evitar que a ação penal contra Ramagem avance: a Câmara, sob sua liderança, ingressou com uma ADPF no STF tentando assegurar a suspensão do processo. Ou seja: busca anular os efeitos da condenação, ao menos no âmbito parlamentar.
- Dessa forma, a decisão sobre mandato, cassação ou sanções políticas fica postergada — sob o argumento de que há “fase recursal” ou controvérsias jurídicas.
Esse comportamento reflete um receio institucional: conduzir uma cassação poderia aprofundar crise política, dividir bancadas e trazer instabilidade — especialmente em um ambiente sensível como o atual.
O veto à votação externa: controle do mandato mesmo à distância
Apesar da passividade sobre a cassação, Motta decidiu vetar que deputados condenados ou em processo penal participem de votações de dentro do exterior. Em outras palavras: quem estiver nos EUA, preso ou foragido, não poderá exercer o direito de voto ou presença em deliberações.
Essa medida afasta a possibilidade de “mandato remoto” ou de que condenados sigam exercendo influência legislativa enquanto fora do país — um movimento que busca equilibrar o direito de representação e a legitimidade do Parlamento.
Para Motta, a medida serviria para preservar a credibilidade institucional e evitar que decisões importantes sejam tomadas por parlamentares ausentes fisicamente ou fora do país.
A contradição e as críticas que emergem
O paradoxo da posição de Motta é claro:
- Se, por um lado, ele impede que Ramagem vote de fora do país, preservando formalmente a integridade das decisões da Câmara;
- Por outro, ele evita discutir a cassação do mandato, o que mantém Ramagem como deputado ativo — inclusive com acesso a salário, verba de gabinete e outros benefícios públicos.
Críticos acusam Motta de adotar uma postura de conveniência: evitar um salto institucional (cassação) que gere grande crise, mas permitir a manutenção de privilégios enquanto a impunidade ainda prevalece.
Além disso, há o argumento de que o veto à votação externa não resolve o cerne da questão: a prestação de contas e a legitimidade do mandato de quem foi condenado e fugiu do país.
O que está em jogo
- Sobrecarga moral e institucional — manter um deputado condenado e foragido com mandato ativo fere a percepção pública de que o Parlamento representa os cidadãos com responsabilidade.
- Precedente perigoso — ao permitir esse tipo de permanência, a Câmara envia o sinal de que status parlamentar é um escudo permanente, mesmo diante de condenações criminais definitivas.
- Fragilidade da autoridade de Motta — ao evitar a cassação, Motta demonstra que prefere soluções técnicas do que políticas, o que pode enfraquecê-lo no futuro.
- Risco de impunidade ampla — se o mandato continuar ativo, há chance de que o deputado tente voltar, proponha projetos ou influencie decisões, mesmo sob condenação — o que preocupa a oposição e parte da sociedade.
Conclusão
Com sua postura, Hugo Motta parece buscar um meio-termo: ele impede que Ramagem exerça influência parlamentar de dentro dos EUA, mas evita dar o passo mais simbólico e pesado — a perda de mandato.
Essa abordagem permite adiar um conflito maior dentro do Congresso, mas alimenta a percepção de que, para políticos influentes, as regras podem ser diferentes. E esse tipo de ambiguidade institucional, em um momento de grande crise, pode custar caro — não apenas para a credibilidade da Câmara, mas para a própria ideia de democracia que ela representa.

