Economia

Regulador do mercado financeiro inicia debate técnico para revisar regras de financiamento coletivo de empresas no país

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) deu início a um importante processo de revisão regulatória ao abrir uma consulta pública voltada ao aprimoramento das normas que regem o crowdfunding de investimentos no Brasil. A medida, anunciada em meio ao crescente interesse por modelos alternativos de financiamento empresarial, busca atualizar e tornar mais eficiente o arcabouço normativo que disciplina essa modalidade de captação de recursos no mercado de capitais.

O crowdfunding de investimentos — também conhecido como equity crowdfunding — é uma forma de financiamento coletivo em que empresas, geralmente de pequeno e médio porte, captam recursos diretamente de investidores por meio de plataformas digitais autorizadas. Em troca, os participantes adquirem títulos, ações ou participações societárias nessas companhias, apostando no seu crescimento e eventual valorização.

Nos últimos anos, esse modelo se tornou uma alternativa viável para startups e negócios inovadores, sobretudo aqueles que enfrentam dificuldades para acessar linhas tradicionais de crédito bancário ou atrair grandes investidores institucionais. Ao mesmo tempo, abriu espaço para que investidores individuais pudessem diversificar suas carteiras com aportes menores em empresas em estágio inicial.

O atual marco regulatório — estabelecido principalmente pela Resolução CVM nº 88, em vigor desde 2022 — trouxe avanços importantes, como o aumento do limite de captação por oferta (para até R$ 15 milhões por rodada), a exigência de registro das plataformas e regras mínimas de governança, transparência e prestação de contas. Contudo, a evolução acelerada do mercado e o surgimento de novos modelos de negócio tornaram necessária uma reavaliação das normas existentes.

A proposta de consulta pública aberta pela autarquia visa justamente colher sugestões, críticas e contribuições técnicas da sociedade civil, especialistas, representantes das plataformas, investidores e demais agentes do setor. Entre os temas colocados em pauta estão:

  • Revisão de limites de captação e de investimento por investidor;
  • Aprimoramento dos critérios de divulgação de informações pelas empresas ofertantes;
  • Regras de governança para as plataformas intermediadoras;
  • Possibilidade de revenda secundária de participações adquiridas via crowdfunding;
  • Proteção do investidor não profissional em ofertas mais arriscadas;
  • Exigências contábeis e de auditoria para empresas que captam recursos.

A CVM afirma que o objetivo é promover um ambiente regulatório mais moderno, proporcional aos riscos envolvidos e favorável à inovação, sem comprometer os princípios de proteção ao investidor e integridade do mercado. A consulta pública ficará aberta por um período determinado, após o qual as sugestões serão analisadas tecnicamente antes da publicação de uma nova norma ou da alteração da regulação vigente.

Especialistas do setor financeiro consideram a iniciativa positiva e oportuna. Em um momento em que os meios digitais ganham espaço como ferramentas de intermediação financeira, e os modelos tradicionais de crédito continuam restritivos para pequenos empreendedores, o crowdfunding se consolida como uma via de acesso ao capital que precisa de normas claras, previsíveis e alinhadas com a realidade tecnológica.

Outro ponto relevante é o crescimento exponencial de plataformas digitais autorizadas pela CVM para operar nesse segmento. Em 2017, quando o crowdfunding foi regulado pela primeira vez no país, havia menos de uma dezena de plataformas ativas. Atualmente, são dezenas espalhadas por diferentes regiões, oferecendo ofertas dos mais variados setores — de tecnologia a agroindústria, de serviços financeiros a empreendimentos imobiliários.

Apesar do avanço, o mercado ainda é considerado incipiente se comparado a outras economias. Parte disso se deve à percepção de risco por parte dos investidores, bem como à dificuldade das empresas em atender todos os requisitos legais e operacionais. Nesse sentido, a consulta pública pode abrir espaço para reduzir entraves burocráticos, sem comprometer os controles essenciais.

Há também interesse crescente por parte de associações empresariais, fundos de investimento e organizações ligadas ao ecossistema de inovação para que a nova regulação contemple mecanismos mais robustos de monitoramento e prestação de contas pelas empresas que captam recursos, inclusive após o encerramento das ofertas. A ausência de um mercado secundário para negociação das participações adquiridas é outro ponto frequentemente levantado por investidores como obstáculo à liquidez e ao engajamento mais amplo no setor.

A CVM reconhece que a regulação precisa acompanhar a maturação do mercado. Ao lançar mão do instrumento da consulta pública, a autarquia reforça seu compromisso com uma atuação transparente, participativa e orientada por evidências. A expectativa é de que, ao fim do processo, as novas regras tragam maior segurança jurídica, incentivo à inovação e expansão responsável do acesso ao mercado de capitais por parte de pequenas e médias empresas brasileiras.

A participação da sociedade na consulta é vista como fundamental para garantir que a regulação reflita a pluralidade de interesses e experiências presentes nesse ecossistema. Com isso, o Brasil dá mais um passo na direção de fortalecer um ambiente financeiro mais democrático, acessível e conectado com as novas dinâmicas da economia digital.

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