Economia

Pauta antidiversidade de Trump chega ao Brasil e coloca em risco oportunidades para pessoas trans

Do lado de lá: o que Trump está fazendo

O novo governo americano, com Donald Trump de volta à presidência, tem adotado medidas claras para desmontar programas de diversidade, equidade e inclusão (DEI). São ações que vão desde decretos para eliminar escritórios governamentais que cuidam diretamente dessas pautas, até pressão sobre empresas privadas para que abandonem ou ajustem políticas de inclusão. Há também ordens executivas que proíbem programas de DEI em agências federais e em empresas contratadas pelo governo, além de iniciativas legais e judiciais que suspendem temporariamente essas políticas.

Essa ofensiva inclui atacar o reconhecimento de gênero, limitar programas que beneficiam grupos historicamente marginalizados, e questionar princípios como gênero como identidade. Pessoas trans, por sua vulnerabilidade social e histórica, estão entre os grupos mais afetados pelas decisões e discursos que tornam sua condição motivo de debate político ou judicial.

Reflexos chegando ao Brasil

Mesmo sem um decreto igual em território nacional, algumas reverberações dessa pauta já podem ser percebidas no Brasil:

  • Empresas brasileiras que são filiais de multinacionais com sede nos EUA ou que fazem negócios com clientes americanos estão atentas. Algumas relataram mudanças sutis de linguagem em suas práticas de diversidade, para não confrontar diretrizes vindas de suas matrizes internacionais, por medo de retaliação ou perda de contratos.
  • A cobertura da imprensa brasileira também tem dado espaço às decisões americanas, e isso reforça narrativas internas, principalmente em discursos conservadores, que veem políticas de gênero ou inclusão LGBTQIA+ como “excessos” ou elementos de ideologia.
  • Para pessoas trans no Brasil, isso causa incômodo, medo e incerteza: se empresas adotarem posturas mais cautelosas ou negarem visibilidade às pautas trans, o ambiente de trabalho para essas pessoas pode ficar mais hostil, menos seguro e com menos espaço para auto afirmação.

Como isso afeta a empregabilidade de pessoas trans

A empregabilidade trans já enfrenta barreiras consideráveis no Brasil — preconceito direto, discriminação nos processos seletivos, falta de proteção legal efetiva, dificudades de uso de nome social, de identidade de gênero, entre outras. Com a influência crescente da pauta antidiversidade, esses desafios podem se intensificar:

  • Processo seletivo: empresas podem evitar destacar políticas de diversidade, DEI, LGBT+ ou uso do nome social, por receio de repercussão negativa ou por mudanças em políticas corporativas internacionais. Isso pode levar à invisibilidade ou à exclusão indireta.
  • Ambiente de trabalho: se houver recuo institucional no apoio à diversidade, pessoas trans podem sofrer mais discriminação sem amparo. A falta de programas de acolhimento ou de políticas claras de respeito ao gênero e identidade pode aumentar casos de assédio, exclusão ou micro-violências.
  • Visibilidade e redes de apoio: iniciativas que promovem pessoas trans no mercado de trabalho muitas vezes dependem de visibilidade institucional. Um retrocesso pode enfraquecer essas iniciativas, dificultar mentorias, programas de qualificação ou campanhas de diversidade.
  • Saúde mental e rotinas laborais: o ambiente menos seguro e mais hostil, aliado ao medo de perda de direitos ou de retração de políticas de inclusão, pode gerar impacto negativo sobre autoestima, saúde mental, produtividade e permanência no emprego.

Limites e resistências no Brasil

Apesar dos riscos, há fatores que atenuam o impacto no Brasil:

  • O arcabouço legal brasileiro contempla direitos LGBTQIA+ em muitas leis estaduais e municipais, além de decisões judiciais que garantem o uso do nome social e que protegem travestis e pessoas trans de discriminações formais.
  • A sociedade civil, organizações de direitos humanos e coletivos trans são ativos e atuantes, denunciando discriminações, apoiando vítimas e pressionando por leis e políticas públicas.
  • Muitas empresas brasileiras já haviam institucionalizado políticas de diversidade e inclusão, não só por convicção, mas também como exigência de mercado (investidores, consumidoras, reputação). Isso cria certa “inércia” de políticas que pode frear retrocessos.
  • O fato de que grande parte das demandas trans de empregabilidade envolve pequenas e médias empresas, setores informais, ou autônomos, onde decisões são mais locais, menos suscetíveis a influências diretas do cenário americano.

Possíveis cenários futuros

  • Cenário mais adverso: empresas com matriz americana cortam apoio formal às políticas DEI, gerando efeito cascata; coletivos trans enfrentam mais desproteção; aumento de reclamações trabalhistas; redução da visibilidade trans em cargos públicos ou de destaque corporativo.
  • Cenário intermediário: as empresas mantêm programas de inclusão, mas diminuem a divulgação, suavizam discursos, tornam as políticas menos visíveis; pessoas trans continuam a trabalhar, mas com mais cautela, com medo de retaliação ou discriminação menos explícita.
  • Cenário positivo: reação forte da sociedade, fortalecimento de leis estaduais e municipais, resiliência de empresas brasileiras independentes que valorizam diversidade; maior pressão por transparência corporativa e avaliação de práticas de acessibilidade.

Importância de vigilância e ação

Para evitar que o efeito antidiversidade se traduza em perda de oportunidades para os trans, alguns pontos são essenciais:

  • Monitoramento: coletar dados sobre empregabilidade trans, denúncias de discriminação, desligamentos ou recusas; isso permite identificar padrões e agir.
  • Legislação direta e clara: reforçar leis estaduais e federais que protejam pessoas trans no mercado de trabalho, no uso do nome social, nos documentos, no acesso a saúde e ao serviço público.
  • Educação corporativa: programas de sensibilização, treinamento em diversidade e inclusão, para que gestores e equipes entendam o valor da pluralidade e combate ao preconceito explícito e implícito.
  • Visibilidade positiva: apoiar pessoas trans em posições de liderança, comunicação pública, função de exemplo, para contrapor narrativas negativas que possam surgir com o retrocesso da diversidade.

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