Politica

Ministro Gilmar Mendes adverte contra mudanças oportunistas no foro privilegiado e defende responsabilidade institucional em propostas de emenda constitucional

Em meio aos debates legislativos que voltaram a colocar o foro por prerrogativa de função — popularmente conhecido como “foro privilegiado” — no centro das atenções, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), posicionou-se de forma crítica e contundente sobre os rumos da chamada PEC do Foro. Segundo ele, o atual formato da proposta carrega um forte componente de casuísmo, e alterações estruturais na Constituição não podem ser feitas ao sabor de conveniências políticas momentâneas.

A crítica do decano do STF veio em um momento em que o Congresso Nacional discute novos contornos para o foro privilegiado, com sugestões que visam reduzir ou até extinguir esse dispositivo para algumas autoridades — ou, em outros casos, remoldá-lo em contextos mais específicos. Para Gilmar Mendes, propostas dessa natureza não devem ser tratadas com pressa nem como ferramentas para atingir adversários ou proteger aliados, mas sim como questões institucionais de longo alcance, que exigem amadurecimento, técnica e senso de responsabilidade.

A preocupação manifestada por Gilmar está diretamente ligada ao histórico de tentativas legislativas de interferência em temas sensíveis ao Judiciário. O ministro tem destacado, reiteradamente, que mudanças na estrutura de garantias constitucionais devem ser motivadas por princípios jurídicos sólidos, e não por disputas circunstanciais que podem comprometer a estabilidade institucional. Ele observa que, sempre que o foro é discutido em meio a crises políticas, há o risco de que o debate seja contaminado por interesses pontuais, o que enfraquece o papel do Parlamento como formulador de normas estruturantes.

Em suas palavras mais recentes sobre o assunto, o magistrado pediu “juízo” aos parlamentares, ressaltando que qualquer proposta de alteração constitucional deve respeitar os fundamentos do Estado de Direito e o equilíbrio entre os Poderes. A menção ao termo “casuísmo” não foi casual. Para Gilmar, há clara sinalização de que a motivação por trás da PEC não é apenas técnica, mas também política — o que exige atenção redobrada da sociedade, dos juristas e das próprias instituições.

A questão do foro privilegiado tem sido alvo de polêmica há anos no Brasil. Críticos apontam que o dispositivo é usado como escudo por autoridades para evitar julgamentos em instâncias inferiores, o que poderia garantir celeridade e imparcialidade em determinados casos. Já os defensores do foro argumentam que ele é uma proteção institucional necessária para o exercício de funções públicas sensíveis, evitando perseguições judiciais locais ou decisões judiciais motivadas por disputas políticas regionais.

Gilmar Mendes, que já foi presidente do Supremo e é um dos ministros mais experientes da Corte, não se opõe ao debate em si. Ao contrário, ele reconhece a importância de se discutir o aperfeiçoamento do sistema de Justiça. No entanto, ele insiste que tais discussões devem ocorrer em ambientes técnicos, com base em estudos consistentes, e não como resposta reativa a episódios pontuais.

O momento em que a PEC do Foro volta à pauta coincide com o avanço de investigações que envolvem autoridades de diferentes esferas do poder, o que levanta suspeitas de que a proposta possa estar sendo moldada de forma a beneficiar ou prejudicar determinados atores políticos. Essa percepção de seletividade preocupa juristas e ministros do STF, que veem na estabilidade das regras institucionais um dos pilares do funcionamento democrático.

Gilmar Mendes também relembrou, em outras ocasiões, que o próprio Supremo já avançou significativamente na limitação do foro por prerrogativa de função. Em decisões anteriores, a Corte estabeleceu que o foro se aplica apenas a crimes cometidos durante o mandato e em razão do cargo. Essa interpretação, mais restritiva, reduziu consideravelmente o número de autoridades com direito ao foro e esvaziou o argumento de que a Justiça estaria engessada pelo dispositivo constitucional.

Mesmo com essa reinterpretação judicial, o tema voltou com força ao Legislativo, desta vez com tentativas de alterar diretamente a Constituição. Para Gilmar Mendes, esse tipo de mudança, por seu impacto duradouro e suas implicações institucionais, precisa de serenidade e amplitude de diálogo. Ele adverte que mexer nas regras de foro sem considerar os efeitos sobre o sistema de freios e contrapesos entre os Poderes pode gerar distorções graves, tanto do ponto de vista jurídico quanto político.

O ministro defende que, se o Congresso quiser efetivamente reformar o sistema de foro, o faça com responsabilidade, ouvindo especialistas, instituições e a própria sociedade civil. Para ele, a solução duradoura não virá de propostas apressadas ou elaboradas com base em conjunturas específicas, mas de uma reforma institucional legítima, transparente e tecnicamente fundamentada.

O posicionamento de Gilmar Mendes ecoa entre ministros do STF que veem com desconfiança o avanço de propostas legislativas que tocam diretamente em estruturas sensíveis da Justiça. O alerta do ministro visa proteger não apenas a Constituição, mas também o equilíbrio delicado entre os Poderes, em um momento em que a institucionalidade brasileira continua sendo testada por crises políticas recorrentes.

Com isso, o debate em torno da PEC do Foro ganha mais um elemento de tensão: a necessidade de distinguir reformas legítimas de manobras casuísticas. Para Gilmar, o Brasil precisa de mudanças estruturais, mas elas devem ser feitas com juízo, visão de Estado e compromisso com a democracia.

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