Economia

O que os coaches não te contam sobre o futuro do trabalho

O discurso sobre o futuro do trabalho virou um dos terrenos preferidos dos coaches. Promessas de liberdade financeira, horários flexíveis, renda ilimitada e carreiras “sem chefes” aparecem como verdades quase inevitáveis. Mas por trás das frases motivacionais e dos gráficos otimistas, existe uma realidade bem mais complexa — e menos confortável — que raramente é mencionada.

A primeira omissão está na ideia de que todo mundo pode se reinventar com facilidade. Fala-se como se aprender novas habilidades fosse apenas uma questão de vontade, quando, na prática, tempo, dinheiro, acesso à educação de qualidade e estabilidade mínima fazem toda a diferença. Nem todos conseguem “mudar de carreira” enquanto pagam aluguel, cuidam de filhos ou enfrentam jornadas exaustivas. O futuro do trabalho não começa do mesmo ponto para todos.

Outro ponto pouco explorado é que a automação não elimina apenas empregos repetitivos. Ela também pressiona profissões qualificadas, reduzindo salários, concentrando oportunidades e aumentando a competição global. Plataformas digitais permitem que empresas contratem profissionais de qualquer lugar do mundo, o que amplia o mercado, mas também enfraquece o poder de barganha de quem trabalha. A promessa de mais oportunidades vem acompanhada de maior insegurança.

Os coaches costumam exaltar o empreendedorismo como solução universal, mas raramente falam sobre taxas de fracasso. A maioria dos pequenos negócios fecha antes de completar poucos anos, e o risco é assumido quase integralmente pelo indivíduo. No futuro do trabalho, empreender muitas vezes significa trocar a instabilidade de um emprego pela instabilidade total, sem férias, sem proteção social e com renda imprevisível.

Há também o silêncio sobre a intensificação do trabalho. A tecnologia, que deveria liberar tempo, frequentemente faz o oposto. Mensagens constantes, metas agressivas, múltiplas plataformas e a lógica da performance permanente tornam o trabalho mais invasivo. Trabalhar de qualquer lugar não significa trabalhar menos; muitas vezes significa trabalhar o tempo todo, sem fronteiras claras entre vida pessoal e profissional.

Outro aspecto ignorado é o enfraquecimento das proteções coletivas. O futuro do trabalho tende a ser mais individualizado, com menos sindicatos fortes e menos negociação coletiva. Isso transfere para o indivíduo a responsabilidade de se proteger, se qualificar, negociar e planejar o próprio futuro. O discurso motivacional vende autonomia, mas entrega solidão institucional.

Os coaches também raramente mencionam que o futuro do trabalho será marcado por desigualdades ainda mais visíveis. Profissionais altamente qualificados, em áreas estratégicas, terão múltiplas opções. A maioria, porém, enfrentará rotatividade, contratos frágeis e renda volátil. O mercado não será um campo aberto de oportunidades, mas um ambiente cada vez mais polarizado.

Por fim, existe uma verdade incômoda: o futuro do trabalho não será decidido apenas por escolhas individuais. Ele depende de políticas públicas, regulação, educação, proteção social e distribuição de poder. Nenhum mindset substitui um sistema que funcione. A narrativa de que “basta querer” serve mais para aliviar a responsabilidade das estruturas do que para preparar as pessoas para o que vem.

Entender o futuro do trabalho exige menos frases de efeito e mais realismo. Exige reconhecer riscos, limites e conflitos, além das oportunidades. O problema não é buscar autonomia, flexibilidade ou novos caminhos. O problema é acreditar que isso virá sem custos, sem perdas e sem disputas. E isso, definitivamente, os coaches não costumam contar.

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