Economia

Quando decisões do STF podem intensificar o afastamento dos jovens da CLT

O tema da redação da Fuvest deste ano — o “repúdio de jovens à CLT” — não surgiu por acaso. Pesquisas mostram que boa parte da nova geração vê o regime celetista como burocrático, engessado e distante da dinâmica atual de trabalho. Mas há um ponto adicional: certas decisões recentes do STF, embora tenham objetivos específicos, acabam reforçando essa sensação de descolamento entre a lei trabalhista tradicional e a realidade dos jovens.

A seguir, entenda como isso acontece e por que o debate volta a ganhar força no momento em que o país discute novas formas de trabalho, modelos híbridos, plataformas digitais e impactos da economia pós-pandemia.


O novo mundo do trabalho e o incômodo dos jovens

A geração que entra agora no mercado prefere flexibilidade, autonomia e possibilidades múltiplas de renda. Muitos atuam como freelancers, criadores de conteúdo, motoristas ou entregadores de aplicativos, prestadores de serviço remoto ou profissionais que alternam meses de trabalho intenso com períodos de pausa.

Nesse contexto, a CLT — com horários fixos, vínculo único, hierarquia rígida e forte tutela estatal — parece pouco atraente. Para muitos jovens:

  • A CLT é vista como estática, enquanto o mercado é dinâmico.
  • O modelo de proteção trabalhista tradicional não conversa com a gig economy.
  • O vínculo celetista parece limitar o potencial de ganhos variáveis, que muitos buscam.

Essa percepção antecede qualquer decisão judicial, mas certas movimentações no Supremo contribuem para cristalizar a ideia de que o Estado privilegia estruturas antigas em vez de adaptar o sistema para novas formas de trabalho.


Como decisões do STF podem agravar essa rejeição

1. Reinterpretação do trabalho por aplicativos

Sempre que o STF sinaliza maior chance de vínculo formal obrigatório entre plataformas e trabalhadores, parte dos jovens entende isso como ameaça ao modelo que permite autonomia de horários e múltiplas fontes de renda.

Mesmo que a intenção seja proteger trabalhadores precarizados, o efeito social é outro:
muitos jovens passam a acreditar que o Estado busca “forçar” a CLT em modelos que não desejam, mesmo que a realidade dessas ocupações seja complexa e extremamente heterogênea.

2. Julgamentos que reduzem espaço para contratos alternativos

Nos últimos anos, o STF analisou temas como trabalho intermitente, terceirização ampla e acordos individuais.
Sempre que o Tribunal derruba ou restringe algum mecanismo mais flexível, isso isola ainda mais a CLT como o único grande pilar disponível.

Para os jovens, isso soa como fechamento de portas num mercado que exige movimentação rápida e pluralidade de vínculos.

3. A simbologia de um tribunal que representa o Estado “paternalista”

O STF tem sido protagonista na revisão de vários aspectos da reforma trabalhista.
Independentemente do mérito jurídico, o imaginário social recebe essas decisões como uma reafirmação da visão tradicional do trabalho, baseada em subordinação formal, direitos rígidos e estruturas centralizadas.

Para uma geração que cresceu em ambientes digitais horizontais, isso parece uma tentativa de controlar um mercado que já mudou.


Por que isso pesa mais exatamente agora

  1. Aumento do empreendedorismo juvenil:
    Nunca tantos jovens abriram MEIs ou trabalharam de forma independente.
  2. Desconfiança em relação a carreiras longas dentro da mesma empresa:
    A lógica de “emprego para a vida toda” não convence mais.
  3. Busca por renda imediata:
    Modelos flexíveis permitem ganhos rápidos, enquanto a CLT é vista como lenta, cheia de obrigações e custos.
  4. Debate público mais intenso:
    Cada decisão do STF sobre trabalho vira manchete nacional, reforçando o peso simbólico.

O que poderia aproximar jovens da CLT — e não afastá-los ainda mais

Apesar da rejeição crescente, especialistas apontam caminhos que poderiam aproximar a nova geração do regime celetista:

  • Modelos híbridos, que combinem proteção social com maior autonomia de horários;
  • Flexibilização responsável de jornadas, permitindo variações sem perda de direitos essenciais;
  • Reforma previdenciária focada no trabalhador intermitente e no autônomo digital;
  • Reconhecimento de múltiplos vínculos sem penalidades ou burocracias;
  • Segurança jurídica, para que empresas contratem sem medo constante de judicialização.

O objetivo seria preservar direitos básicos — férias, 13º, proteção previdenciária — sem desconsiderar a nova realidade econômica.


Conclusão

O afastamento dos jovens da CLT é multifatorial, mas o STF, como principal intérprete constitucional do país, influencia o clima em torno do tema — sobretudo quando reforça modelos mais rígidos ou revisa instrumentos de flexibilização.

A tensão não está entre “juventude versus direitos”, mas entre um mercado que muda rápido e um arcabouço jurídico que muda devagar.
Enquanto essa distância persistir, decisões judiciais tendem a alimentar a percepção de que o Estado insiste em proteger um modelo laboral que já não contempla as ambições e o ritmo das novas gerações.

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