Esporte

Crise na Libra: acusações de “competitividade predatória” marcam ruptura entre Flamengo e demais clubes

O futebol nacional atravessa uma das maiores disputas institucionais de sua história recente. O centro da crise é a Libra, grupo formado para organizar a venda coletiva dos direitos de transmissão, mas que agora vive um embate direto com o Flamengo. O clube carioca, insatisfeito com os critérios de divisão das receitas, recorreu à Justiça para bloquear valores milionários que seriam distribuídos entre os demais participantes. A medida foi interpretada como um ataque frontal à união entre os times e ganhou o rótulo de “competitividade predatória”.


O estopim da confusão

Tudo começou com o contrato assinado pelos clubes da Libra para centralizar os direitos de televisão e streaming. A ideia inicial era simples: dividir as receitas em três partes — uma fatia igualitária, outra proporcional ao desempenho esportivo e uma terceira baseada na audiência que cada time atrai. Esse último ponto, no entanto, se tornou explosivo.

O Flamengo, dono da maior torcida do país e um dos principais geradores de audiência, defende que sua fatia seja consideravelmente maior que a dos demais. Já os outros clubes enxergam a necessidade de limitar essa diferença para evitar um abismo ainda maior entre ricos e pobres. A votação interna acabou favorecendo a maioria, que optou por um modelo de equilíbrio. Inconformado, o clube carioca decidiu agir por conta própria.


A liminar e o efeito cascata

Com a liminar conquistada, valores que seriam distribuídos a todos os integrantes da Libra ficaram bloqueados. Estima-se que dezenas de milhões de reais estejam retidos, justamente em um momento em que clubes médios e pequenos enfrentam dificuldades para pagar salários, quitar dívidas e manter suas operações básicas.

A medida foi classificada por dirigentes rivais como uma tentativa de sufocar financeiramente os demais para forçar uma reabertura da negociação. A manobra, considerada por muitos como desleal, alimentou críticas de que o Flamengo estaria jogando sozinho em um jogo que deveria ser coletivo.


O conceito de “competitividade predatória”

A expressão passou a ser usada para descrever o comportamento do clube carioca. Em vez de competir em campo ou buscar acordos dentro das regras estabelecidas, o Flamengo teria optado por um caminho de imposição, explorando seu poder econômico e de torcida para enfraquecer a base da Libra.

A crítica não se limita a uma questão moral. Para analistas do esporte, esse tipo de atitude ameaça a própria viabilidade de uma liga nacional forte. Sem confiança entre os clubes e sem previsibilidade financeira, patrocinadores e emissoras podem repensar investimentos. Uma liga fragmentada perde valor de mercado e compromete sua credibilidade perante o público.


O outro lado da moeda

Por sua vez, o Flamengo defende que apenas busca o reconhecimento de sua força real. O clube argumenta que sua audiência é inigualável e que, portanto, deve ser devidamente remunerado. Para a diretoria rubro-negra, o atual modelo “pune” quem gera mais interesse e mais receita, nivelando por baixo um mercado que deveria ser impulsionado por quem atrai torcedores e patrocinadores.

Esse discurso, no entanto, não convence a maioria dos demais clubes, que veem na postura do Flamengo uma tentativa de perpetuar desigualdades históricas e minar a essência de um acordo coletivo.


Riscos e consequências

O impasse coloca em risco não apenas a Libra, mas todo o projeto de liga nacional no Brasil. Caso não haja acordo, três cenários se desenham:

  1. Revisão do contrato – Flamengo e demais clubes podem renegociar os critérios de distribuição, buscando uma solução intermediária que atenda aos dois lados.
  2. Judicialização permanente – Se cada impasse virar caso de Justiça, a liga corre o risco de se tornar refém de disputas intermináveis, perdendo credibilidade.
  3. Ruptura – No cenário mais extremo, alguns clubes podem abandonar a Libra e buscar novos caminhos, o que fragmentaria ainda mais o futebol brasileiro.

Além disso, a disputa escancara um problema estrutural: a dificuldade dos clubes em conciliar interesses individuais com a necessidade de fortalecimento coletivo.


Reflexão final

O episódio entre Flamengo e Libra mostra que a criação de uma liga nacional não depende apenas de contratos e assinaturas, mas de confiança mútua e senso de responsabilidade coletiva. A busca por protagonismo é legítima, mas quando ultrapassa o limite e ameaça a sobrevivência de outros, transforma-se em uma “competitividade predatória” que enfraquece a todos.

O Brasil tem potencial para construir um modelo sólido, capaz de rivalizar com grandes ligas internacionais, mas isso só será possível se os clubes compreenderem que a verdadeira força está na união. Se o caminho escolhido for o da imposição e da ruptura, o resultado será um campeonato cada vez mais desigual e, paradoxalmente, menos atraente para torcedores e investidores.

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