Politica

Anistia seria “Alzheimer coletivo”: reflexões sobre memória, política e impunidade

O debate sobre anistia para envolvidos nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro ganhou nesta semana um tom crítico e provocador. Para muitos analistas e setores da sociedade civil, a possibilidade de perdoar condutas que atentaram contra instituições democráticas configura algo mais profundo do que uma simples decisão jurídica: seria um “Alzheimer coletivo”, uma metáfora para o esquecimento intencional de responsabilidades e consequências.

Memória e política: quando o esquecimento é seletivo

A comparação com o Alzheimer não é casual. Em termos médicos, a doença implica perda gradual da memória e da capacidade de julgar o presente à luz do passado. Politicamente, a expressão sugere que a sociedade e suas lideranças poderiam adotar uma postura de esquecimento seletivo, ignorando acontecimentos recentes que exigiriam punição ou reflexão profunda.

No contexto brasileiro, a discussão sobre anistia coloca em choque dois princípios centrais:

  • O da justiça e da responsabilização, que defende que quem cometeu atos ilegais deve ser responsabilizado para que a democracia se fortaleça.
  • O da conciliação e pacificação, que sustenta que certos perdões podem evitar conflitos e tensionamentos políticos prolongados, em nome de estabilidade e governabilidade.

O risco apontado pelos críticos é que a anistia, se aprovada de forma ampla e sem critérios claros, transforme a sociedade em uma espécie de “memória fraca”: lembrará do ocorrido, mas não aplicará consequências, tornando o ciclo de impunidade mais frequente e naturalizado.

Implicações sociais e políticas

Um “Alzheimer coletivo” no âmbito político teria efeitos significativos:

  1. Normalização da impunidade: se atos graves contra instituições forem esquecidos, cria-se um precedente perigoso para futuros abusos.
  2. Desvalorização da democracia: a percepção de que não há consequências concretas pode enfraquecer a confiança das pessoas nas instituições.
  3. Fragilização de regras e normas: leis e regulamentos perdem efetividade se houver sensação de que violá-los não acarreta penalidades reais.
  4. Tensão social crescente: setores que defendem justiça podem reagir de forma mais radical diante de concessões percebidas como injustas.

O debate público e a responsabilidade da sociedade

Para analistas políticos, o ponto central não é apenas jurídico, mas também cultural e social. Uma democracia saudável depende de memória coletiva ativa: saber o que aconteceu, discutir os erros, punir os responsáveis e, a partir daí, buscar reconciliação e aprendizado.

Quando a discussão se desloca para a anistia sem critérios claros, corre-se o risco de que a memória histórica seja distorcida ou apagada, criando um cenário em que os atos graves se repetem porque foram tratados como episódios descartáveis.

Entre perdão e esquecimento

O debate sobre anistia é, portanto, também um debate sobre a forma como a sociedade lida com a memória política e com a responsabilização. A metáfora do Alzheimer coletivo alerta para um dilema: como conciliar a necessidade de estabilidade política com a obrigação de preservar a memória e exigir responsabilidade?

Para muitos, a resposta passa por mecanismos de análise crítica, transparência e limites claros: anistia seletiva, debates públicos, reconhecimento de fatos e medidas de prevenção. Sem isso, corre-se o risco de transformar a sociedade em um espaço onde se esquece o passado, e a democracia, enfraquecida, se torna vulnerável.

Em suma, chamar a anistia de “Alzheimer coletivo” não é apenas provocação retórica: é um alerta sobre os perigos do esquecimento deliberado em um país que precisa, mais do que nunca, manter viva a memória de episódios que testaram suas instituições e princípios.

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