Com movimentação nos bastidores, governador paulista ativa estratégia política e opositores veem avanço iminente do perdão no Congresso
Nos bastidores do Congresso Nacional, o clima é de alerta e expectativa. Após semanas de impasse e negociações discretas, uma nova etapa na tramitação da proposta de anistia aos envolvidos nos atos antidemocráticos de 2023 parece estar prestes a ser desencadeada — impulsionada, em grande parte, por articulações do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Embora ocupe um cargo executivo estadual, ele tem desempenhado papel ativo nas conversas que envolvem parlamentares, líderes partidários e figuras influentes da direita institucional.
A movimentação de Tarcísio não ocorre às claras, mas é sentida nas bancadas e nas salas de negociação de Brasília. Com capital político consolidado entre deputados federais e senadores conservadores, o governador tem usado sua influência para destravar a pauta, considerada sensível tanto no plano jurídico quanto no simbólico.
Do outro lado, integrantes da oposição observam com atenção os sinais. Para eles, o avanço da proposta já é dado como certo — e pode ocorrer já na próxima semana, caso a articulação nos bastidores continue no ritmo atual.
A anistia em questão: contexto e conteúdo
A proposta em discussão no Congresso visa conceder perdão legal a centenas de pessoas que participaram, de forma direta ou indireta, de manifestações ocorridas após as eleições de 2022, culminando nos ataques a prédios dos Três Poderes em janeiro de 2023. A iniciativa, defendida por setores conservadores, propõe distinguir manifestantes de base — que alegadamente teriam sido manipulados — daqueles que participaram de articulações estruturadas ou de ações violentas.
O projeto vem sendo moldado para contemplar réus e investigados que não tenham envolvimento com depredação, invasão ou financiamento explícito dos atos. Trata-se de uma tentativa de equilibrar apelo político e viabilidade jurídica, com o objetivo de reduzir o desgaste de parte do eleitorado conservador sem confrontar abertamente o Judiciário.
O papel de Tarcísio: influência sem exposição direta
Tarcísio de Freitas, embora não assine nenhuma proposta de anistia e mantenha discurso institucionalmente moderado, tem sido descrito como peça-chave na costura entre grupos parlamentares. Com trânsito fluente tanto entre bolsonaristas quanto entre setores do centro-direita, o governador de São Paulo tem trabalhado para garantir adesão suficiente para que a proposta avance no ritmo necessário.
O apoio, segundo fontes próximas ao governador, não é feito por meio de declarações públicas, mas sim de conversas privadas com lideranças partidárias e sinalizações indiretas de que a medida pode contribuir para uma espécie de “pacificação institucional”. Internamente, o cálculo político é claro: uma anistia aprovada com equilíbrio de forças pode reduzir a temperatura no debate nacional e projetar Tarcísio como figura de coesão dentro da direita.
Leitura da oposição: avanço é inevitável
No campo da oposição, a percepção é que a proposta de anistia atravessou uma linha de retorno. Deputados e senadores críticos à iniciativa reconhecem que o movimento político por trás do perdão ganhou tração nos últimos dias, especialmente após intensas articulações fora dos holofotes e apoio informal de figuras influentes como Tarcísio.
Há um entendimento de que a proposta, se for moldada com critérios objetivos e com limitações claras, terá condições de avançar sem provocar reação imediata do Supremo Tribunal Federal ou da Procuradoria-Geral da República. Ainda assim, os opositores alertam que qualquer medida que amenize as consequências legais dos atos antidemocráticos pode ser lida como incentivo à impunidade e desrespeito às instituições.
Parlamentares se reposicionam
A movimentação também já começou a provocar mudanças no comportamento de parlamentares. Deputados que até semanas atrás evitavam associar seus nomes à proposta de anistia passaram a endossá-la publicamente, enquanto líderes partidários do centro começam a discutir estratégias para não ficarem isolados em um tema que pode mobilizar as bases eleitorais em pleno ano pré-eleitoral.
A expectativa é que, ainda na próxima semana, o texto seja pautado em comissões estratégicas da Câmara dos Deputados. A depender da receptividade, a votação em plenário poderá ocorrer ainda em setembro. Caso isso se confirme, será uma das principais vitórias políticas do grupo conservador desde a mudança de governo federal.
Estratégia do silêncio e discurso da reconciliação
Os articuladores da proposta têm adotado uma tática de baixo perfil: evitam declarações contundentes, não promovem atos públicos e trabalham com um discurso de reconstrução nacional. A narrativa construída gira em torno da pacificação, da necessidade de virar a página e da distinção entre militantes ideológicos e criminosos organizados.
Tarcísio, nesse contexto, serve como ponte entre as correntes. Sua imagem de gestor técnico, seu distanciamento dos discursos mais incendiários do bolsonarismo e sua capacidade de diálogo com diferentes setores o colocam como fiador silencioso de um acordo que muitos veem como politicamente inevitável.
O que esperar da próxima semana
Se o ritmo atual das negociações for mantido, a próxima semana pode marcar a virada decisiva na tramitação da anistia. O relator do projeto já prepara ajustes no texto para garantir maior aceitação entre setores da Justiça e da sociedade civil. Bancadas religiosas e ruralistas, que até então mantinham postura neutra, começam a sinalizar apoio — o que reforça a leitura de que a proposta caminha para ser aprovada com ampla margem.
O presidente da Câmara, por sua vez, monitora o ambiente político com atenção e já admite, nos bastidores, que o tema pode ser pautado com apoio de maioria qualificada, desde que respeitadas cláusulas de responsabilidade.
Conclusão: entre o gesto político e a reconfiguração de forças
A eventual aprovação da anistia representará não apenas um gesto de pacificação institucional, mas também um marco na reorganização do campo conservador. Ao liderar discretamente esse processo, Tarcísio de Freitas se consolida como nome-chave da nova direita brasileira — alguém capaz de manter o diálogo com as instituições, mas também de atender aos anseios de uma base que ainda pulsa em torno do bolsonarismo.
Enquanto isso, a oposição se prepara para disputar a narrativa. O embate sobre a anistia, embora técnico e legislativo, é profundamente simbólico: ele dirá muito sobre a força política da direita no Congresso e sobre os rumos da democracia brasileira em um período ainda marcado pelas cicatrizes do confronto institucional.