Economia

Alta judicialização preocupa setor aéreo no Brasil, que vive ‘um processo por voo’

O setor aéreo brasileiro enfrenta um desafio que vai além dos atrasos, tarifas e infraestrutura: a explosão no número de processos judiciais. Segundo dados do mercado, o Brasil registra, em média, um processo judicial para cada voo realizado no país. A situação é considerada crítica por empresas e especialistas, que apontam um ambiente de excessiva judicialização como um dos principais fatores de custo e insegurança jurídica para companhias aéreas que operam no território nacional.

Essa realidade singular tem gerado inquietação entre executivos do setor, que veem no excesso de ações um desequilíbrio na relação entre passageiros e empresas. Em comparação com outros países, o número de ações no Brasil é desproporcional. Enquanto nos Estados Unidos e na Europa o índice de litígios relacionados a voos é baixo e resolvido majoritariamente por canais administrativos, no Brasil os casos seguem diretamente para o Judiciário, frequentemente com pedidos de indenizações por danos morais.

As principais queixas judiciais envolvem atrasos, cancelamentos, extravio de bagagem e problemas com reembolsos e remarcações. Além disso, muitos processos são impulsionados por advogados especializados que atuam com grande volume de causas, promovendo ações em nome de consumidores, muitas vezes com base em modelos padronizados. Para as companhias aéreas, isso cria um cenário de litigância em massa que encarece a operação e dificulta investimentos.

As empresas afirmam que investem em canais de atendimento e acordos extrajudiciais, mas que muitas vezes não há tempo hábil para resolução antes que o processo seja protocolado. O Judiciário, por sua vez, enfrenta o desafio de analisar milhares de ações com temas similares, o que contribui para a sobrecarga do sistema e para decisões conflitantes em diferentes instâncias.

Outro fator de tensão é a interpretação do Código de Defesa do Consumidor, que coloca as companhias em desvantagem, mesmo diante de causas imprevisíveis, como eventos climáticos ou decisões de autoridades aeroportuárias. Para as empresas, não há clareza sobre os limites da responsabilidade, o que torna difícil o planejamento e o cumprimento de obrigações em situações adversas.

Há tentativas em curso para equilibrar esse cenário. Uma das propostas mais discutidas é a criação de mecanismos obrigatórios de mediação antes do ingresso de ações na Justiça, o que já ocorre com sucesso em outros setores. Além disso, entidades do setor defendem a atualização das regras de indenização e da responsabilidade civil, com maior distinção entre problemas evitáveis e situações de força maior.

A judicialização em massa se tornou um ponto de atenção também para investidores estrangeiros, que veem no Brasil um ambiente de risco legal elevado. Com margens já comprimidas por custos operacionais altos, combustível caro e infraestrutura deficiente, os custos com processos acabam sendo repassados ao consumidor, elevando o preço das passagens e reduzindo a competitividade do país.

Enquanto não há uma mudança estrutural nas normas e na cultura de resolução de conflitos, a indústria aérea seguirá enfrentando os céus turbulentos da Justiça brasileira, tentando equilibrar prestação de serviço com a complexa malha jurídica nacional.

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