Zema recua de promessa e tenta transferir controle da Cemig para a União
Durante a campanha ao governo de Minas Gerais, Romeu Zema fez da bandeira das privatizações um de seus principais compromissos com o eleitorado. A venda da Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais), empresa estatal responsável pelo fornecimento de energia elétrica no estado, era um dos principais alvos do discurso liberal do governador. No entanto, ao avançar o segundo mandato, Zema tem adotado uma postura que muitos consideram contraditória: em vez de vender a companhia ao setor privado, ele articula um acordo que pode entregar o controle da estatal para a União.
A mudança de rumo ocorre em meio a negociações para a repactuação da dívida bilionária de Minas Gerais com o governo federal, que gira em torno de R$ 160 bilhões. Para tentar destravar o impasse, Zema acenou com a possibilidade de usar ações da Cemig como moeda de troca, o que abriria espaço para o governo federal assumir parte relevante da companhia. A proposta tem gerado críticas tanto da oposição quanto de setores do próprio eleitorado que esperavam uma privatização direta e transparente.
Privatização travada
Desde o primeiro mandato, Zema encontrou resistência para aprovar a privatização da Cemig. A Constituição de Minas exige que qualquer venda de estatais seja autorizada por meio de um referendo popular, o que tem dificultado os planos do governador. Além disso, a oposição na Assembleia Legislativa se fortaleceu, impedindo o avanço de propostas nesse sentido.
Sem apoio político suficiente e com prazos se encurtando para resolver a questão da dívida, Zema passou a trabalhar com alternativas fora do campo tradicional da privatização. Uma das possibilidades levantadas seria ceder o controle acionário da Cemig ao governo federal em troca de condições mais favoráveis para a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF).
Reação negativa
A estratégia de Zema tem sido duramente criticada por adversários políticos, que acusam o governador de tentar “privatizar por vias indiretas” e, ao mesmo tempo, “entregar um patrimônio mineiro sem consulta à população”. Para muitos, a manobra representa um abandono completo do compromisso feito nas urnas.
Parlamentares mineiros têm se mobilizado contra a proposta, exigindo que qualquer mudança no controle da Cemig passe pela Assembleia Legislativa e por referendo popular, como manda a legislação estadual. Há também pressão de sindicatos e movimentos sociais, que denunciam a entrega da estatal como um retrocesso e um atentado à soberania estadual.
Contradição com discurso liberal
A proposta de repassar a Cemig à União também gerou desconforto entre economistas e apoiadores do mercado. Setores que apoiaram Zema esperando uma política de desestatização clara agora veem na iniciativa um gesto de centralização estatal, em contradição com os princípios liberais defendidos pelo governador e seu partido, o Novo.
Para críticos, ao abrir mão do controle da Cemig para o governo federal, Zema transfere o problema para Brasília e enfraquece a autonomia de Minas Gerais. Mais do que isso, reforça uma dependência do estado em relação à União, algo que o próprio governador dizia combater.
Futuro incerto
A negociação com o governo federal ainda está em curso e não há definição oficial sobre os termos do acordo envolvendo a Cemig. No entanto, os bastidores políticos indicam que o Palácio do Planalto vê com bons olhos a possibilidade de assumir parte do controle da estatal, o que daria ao governo federal um papel estratégico na área de energia em Minas e poderia até ser usado como ativo político em disputas futuras.
Enquanto isso, o impasse sobre a dívida mineira permanece, e a Cemig se torna peça-chave num tabuleiro que mistura promessas não cumpridas, disputas políticas e interesses econômicos. O eleitor mineiro, por sua vez, observa com atenção os rumos de uma estatal que, por décadas, tem sido símbolo de orgulho regional — e agora pode mudar de mãos sem o voto popular que a Constituição exige.