Aspectos fiscais, inércia inflacionária e setor de serviços explicam os juros mais altos em duas décadas
A taxa básica de juros no Brasil, a Selic, permanece no patamar elevado de 14,75%, o mais alto em cerca de 20 anos. Segundo analistas, essa decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) está diretamente relacionada a um conjunto de fatores que afetam o cenário macroeconômico atual, como a política fiscal, a persistência da inflação e, especialmente, a pressão exercida pelo setor de serviços.
Juros altos como resposta à inflação resistente
Com a inflação ainda acima da meta estabelecida, especialistas apontam que a elevação da Selic se tornou uma medida esperada e necessária. Para Matheus Dias, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre), o contexto atual justifica uma política monetária mais restritiva.
“Estamos diante de um cenário que exige juros mais altos para tentar conter os efeitos inflacionários”, explica Dias. Ele ressalta que, embora o comércio exterior não esteja sendo fortemente impactado pelo ambiente internacional, a instabilidade financeira global e o descontrole no consumo interno tornam a tomada de decisão mais complexa.
Segundo ele, o grau de incerteza elevado dificulta as estimativas sobre os impactos da inflação, o que leva o Banco Central a adotar uma postura mais cautelosa na condução da política monetária.
Estrutura econômica mantém juros elevados
O economista Luis Otávio Leal, sócio da G5 Partners, destaca que cada período histórico tem seus próprios desafios, mas a estrutura da economia brasileira segue como um obstáculo para a redução dos juros. Ele chama atenção para a inflação de serviços como um componente que contribui para a rigidez desse cenário.
Comparando com momentos anteriores, Leal lembra que entre 2003 e 2004, a inflação chegou próxima de 16%, o que levou a taxa de juros a atingir 19,75% em 2005. Já em 2006, apesar de uma trajetória de desaceleração da inflação, os serviços ainda apresentavam aumento significativo, com variação de 6,04%.
Inflação de serviços segue como entrave em 2025
O cenário atual guarda semelhanças com aquele de quase 20 anos atrás. De acordo com Leal, a inflação de serviços continua sendo um dos maiores obstáculos. Ele ressalta que fatores como o reajuste do salário mínimo, que no ano anterior foi próximo de 8%, dificultam o controle dessa categoria de preços.
“A inflação de serviços é resistente. É muito difícil reduzi-la com aumentos salariais tão expressivos”, afirma.
Conclusão
A manutenção da Selic em 14,75% reflete um esforço do Banco Central para lidar com um ambiente de inflação persistente, agravado por pressões fiscais e estruturais da economia brasileira. O peso do setor de serviços no comportamento dos preços e a instabilidade do consumo interno tornam o caminho da política monetária mais desafiador. Enquanto essas condições permanecerem, a expectativa de uma queda consistente nos juros tende a se manter distante.